Os 7 Reis mais influentes da História de Portugal
Não fizeram campanha, não pediram votos, não foram eleitos - e, em vez de uma máquina partidária, tinham uma espada. João Ferreira faz a lista dos monarcas que marcaram a história.
Quando não havia Presidentes: os 7 Reis mais influentes da História de Portugal.
1. D. Afonso Henriques
2. D. Dinis
3. D. João I
4. D. João II
5. D. João V
6. D. Maria II
7. D. Carlos
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fonte https://observador.pt/
Em quase 900 anos de história, Portugal teve de tudo na magistratura suprema: de líderes carismáticos a erros de casting, passando por escritores, músicos e artistas plásticos, sem esquecer as figuras medíocres, algumas autênticas nulidades e até uma louca devidamente diagnosticada. Escolher, entre 34 reis e 19 presidentes, os sete mais icónicos foi, como escreveu Umberto Eco na Vertigem das Listas, “uma experiência muito excitante, não tanto por aquilo que conseguimos incluir quanto por tudo aquilo que tivemos de descurar”. Ficaram de fora os presidentes porque – é Jorge Miranda quem o diz – os tempos que correm não se compadecem com Chefes de Estado nem com Supremos Magistrados da Nação.
1. D. Afonso Henriques
Falando de ícones, abram alas para o Pai da Pátria, D. Afonso Henriques (1109-1185). O fundador encabeça esta lista por mérito próprio: a bravura, capacidade de liderança e sagacidade diplomática consagraram-no como cabo-de-guerra e chefe político. À frente de um grupo de cavaleiros minhotos, o filho de Henrique de Borgonha e neto de Afonso VI venceu os apoiantes de sua mãe, D. Teresa, e tomou o poder no Condado Portucalense, em 1128. Passou o resto dos seus longos dias (morreu com 76 anos, caso raro numa época em que a esperança média de vida era inferior a 30 anos) a alargar as fronteiras do território à custa do primo leonês e do inimigo muçulmano, até ver Portugal reconhecido como reino independente (por Afonso VII de Leão e Castela em 1143 e pelo papa Alexandre III em 1179, pela bula Manifestis probatum).
Casou-se em 1146 com D. Mafalda, filha de Amadeu III, conde de Saboia. Além dos sete filhos que teve com a rainha, incluindo o sucessor, D. Sancho I, D. Afonso Henriques foi pai de pelo menos dois bastardos: Fernando Afonso, que chegou a alferes-mor do Reino e grão-mestre dos Hospitalários, filho de Chamôa Gomes; e Pedro Afonso, de mãe desconhecida.
D. Afonso correspondeu-se com S. Bernardo, que interveio de forma decisiva para persuadir os cruzados a tomarem parte na conquista de Lisboa aos mouros, em 1147, e foi amigo de S. Teotónio, do arcebispo de Braga D. João Peculiar — seu braço direito para as questões diplomáticas –, e do templário Gualdim Pais, mestre da Ordem em Portugal.
À sua volta teceram-se mitos que, de tão coloridos, continuam a concorrer com a realidade histórica, apesar de haver muito desmentidos: nasceu com as pernas tortas e foi curado por milagre ou trocado por outro menino pelo aio Egas Moniz que, anos mais tarde, poria uma corda ao pescoço para o defender; bateu na mãe, que lhe rogou uma praga, cumprida quando partiu uma perna durante o cerco de Badajoz; teve uma visão sobrenatural que o ajudou a ganhar a batalha de Ourique, em 1139; foi aclamado rei nas Cortes de Lamego; impôs a nomeação de um bispo negro…
Ainda hoje D. Afonso Henriques provoca discussões — a tese que aponta Viseu em vez de Guimarães ou Coimbra como o lugar onde nasceu tem alimentado uma polémica apaixonada.
2. D. Dinis
A preocupação de D. Dinis (1261-1325) com o povoamento do território e o desenvolvimento da agricultura valeu-lhe o cognome de O Lavrador. Foi o primeiro rei de Portugal mais governante do que guerreiro. Os forais que deu a muitas localidades estimularam a fixação das populações, beneficiando vastas áreas até então incultas, designadamente na Beira Alta e em Trás-os-Montes.
Ao assinar com Fernando IV de Leão e Castela o Tratado de Alcanizes, em 1297, D. Dinis fez da fronteira portuguesa “o mais antigo limite político da Europa”, segundo Orlando Ribeiro.
Deve-se-lhe também a fundação de uma das universidades mais antigas do mundo. Num documento datado de 1 de Março de 1290, o rei anunciava a criação, em Lisboa, de um Estudo Geral, com “cópia de doutores em todas as artes e robustecida com muitos privilégios”, garantindo ainda a protecção aos estudantes. O papa Nicolau IV confirmou a universidade pela bula De statu regni Portugaliae, de 9 de Agosto do mesmo ano. Ficou instalada em Lisboa, perto de S. Vicente de Fora, onde ainda hoje fica a Rua das Escolas Gerais. Em 1308, D. Dinis decidiu transferir o Estudo Geral para Coimbra.
Protector da cultura, o próprio D. Dinis foi poeta. Durante o seu reinado, os documentos oficiais passaram a ser escritos em português.
A imagem do rei a mandar plantar o pinhal de Leiria, ao mesmo tempo que cantava “Ai flores, ai flores do verde pino” e já pensava no aproveitamento da madeira para a construção das caravelas das Descobertas foi um mito ensinado nas escolas do Estado Novo. Mas essa lenda tem um fundo de verdade: a importância do pinhal de Leiria na paisagem portuguesa e o fomento da reflorestação no início do século XIV. O rei Lavrador podia também ser chamado Amigo do Ambiente. E não há dúvidas de que deu um impulso decisivo à marinha nacional ao contratar o genovês Manuel Pessanha como almirante, para dirigir as construções navais e organizar a frota, “na paz como na guerra”.
D. Dinis “nacionalizou” as ordens religiosas-militares e, ao criar a Ordem de Cristo (1315), salvou os templários portugueses da perseguição movida pelo rei de França Filipe IV, o Belo, e pelo papa Clemente V.
O casamento com D. Isabel de Aragão, a Rainha Santa, em 1282, não refreou os ímpetos do rei, que gerou pelo menos meia dúzia de bastardos de diferentes amantes. O especial carinho por um deles, Afonso Sanches, provocou ciúmes ao herdeiro legítimo, o futuro D. Afonso IV, que por causa disso pegou em armas contra o pai e o meio-irmão. A guerra civil durou cinco anos e esteve à beira de uma batalha campal, em Alvalade, então um arrabalde de Lisboa. O banho de sangue terá sido evitado pela Rainha Santa, que, segundo a lenda, se interpôs entre os contendores.
3. D. João I
Não nasceu para ser rei mas teve um dos reinados mais longos da nossa história: 48 anos. A capacidade de liderança revelada por D. João, mestre da Ordem de Avis (1357-1433), durante a revolução de 1383, o cerco de Lisboa, em 1384, e a resistência à invasão castelhana levou os representantes do clero e da nobreza a imitarem o povo e a escolhê-lo como rei, nas cortes de Coimbra de 1385. Inaugurou uma nova dinastia, confirmou Portugal como país independente e lançou, em 1415, a expansão ultramarina. Chamaram-lhe o rei da Boa Memória.
Tudo começou a 6 de Dezembro de 1383, quando D. João, Mestre de Avis, filho bastardo de D. Pedro I e meio-irmão de D. Fernando, o rei há pouco falecido, entrou, com um grupo de amigos armados, no Paço de a-par de São Martinho, ao Limoeiro, em Lisboa. Lá dentro, D. João empunhou um cutelo comprido e desferiu um golpe na cabeça do homem mais poderoso de Portugal. O conde Andeiro não morreu logo e ainda tentou chegar aos aposentos da rainha, sua amante, mas um dos homens do Mestre, Rui Pereira, acabou com ele à espadeirada.
Aos 26 anos, D. João não sonhava com a coroa. Mas temia pela própria vida, pois tinham-lhe dito que a viúva do seu meio-irmão e o amante desta planeavam matá-lo. Foi por medo que o Mestre de Avis apunhalou o conde Andeiro. Por essa altura já Lisboa estava em alvoroço. Perante a insurreição, D. João hesitava. Pensou em fugir para Inglaterra, mas desistiu. Quando os ricos proprietários e mercadores da capital, pressionados pelos homens dos ofícios e pela arraia-miúda, lhe declararam apoio, aceitou o título de Regedor e Defensor do Reino e preparou a resistência ao invasor.
O rei de Castela, Juan I, vinha cobrar a herança de sua mulher, D. Beatriz, filha única de D. Fernando, que a dera em casamento ao vizinho na sequência da terceira derrota consecutiva nas guerras entre os dois países. A maioria dos nobres portugueses, com a rainha Leonor Teles à cabeça, seguiu a lógica feudal e reconheceu a soberania de Beatriz e do marido castelhano. Mas outros membros da fidalguia e, sobretudo, os burgueses e o povo pobre opuseram-se-lhe.
Nos dois anos seguintes, Portugal foi palco de batalhas contra o estrangeiro mas também de uma guerra civil. As Cortes de Coimbra, em Março de 1385, deram razão aos argumentos do jurista João das Regras e deliberaram que o trono estava vago, sendo legítimo eleger um novo rei. Por unanimidade, aclamaram o Mestre de Avis com o nome de D. João I. Mas logo em Agosto seguinte, o novo rei teve que provar ser capaz de manter a coroa na cabeça. Conseguiu-o com a vitória de Aljubarrota. Governou durante mais 47 anos. Em 1415 conquistou a cidade marroquina de Ceuta, dando início ao período da expansão marítima.
O casamento com a inglesa Filipa de Lencastre confirmou a mais antiga aliança do mundo. Mas D. João I não foi só pai da Ínclita Geração: um dos seus filhos bastardos, Afonso, viria a ser o primeiro duque de Bragança, antepassado da última dinastia real portuguesa.