Caso de Tancos: A dimensão disto é maior e assustadora
Em 2016, a Transparência e Integridade - TI-PT publicou um relatório alertando para a falta de transparência do sector da Defesa em Portugal, que incluía avisos sérios sobre a ineficácia dos sistemas de auditoria, a incapacidade de escrutínio do Parlamento e a falta generalizada de dados do conhecimento público.
Alarmada, a então eurodeputada Ana Gomes escreveu ao ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que desvalorizou os alertas e ignorou por completo as recomendações que fizemos. Argumentou uma bizarria do género: "a Defesa em Portugal é transparente, mas essa transparência é secreta".
Tão secreta que agora foi apanhado a escrever a um deputado "Sei, mas não vou dizer".
Isto está muito para lá de saber quem mentiu a quem, ou quem sabia o quê quando - embora isso seja da maior importância; e pessoalmente quero que o tal despacho de acusação, quando sair, explique o que foi investigado quanto à Casa Militar do Presidente. Isto é pior.
Houve cumplicidade entre Polícia Judiciária Militar e criminosos (incluindo militares ou ex-militares) que assaltaram um paiol de armamento das Forças Armadas. Os militares (polícias ou ladrões, já nem sei bem) conluiaram-se depois para fazer reaparecer o armamento - e aí sim, importa saber o papel dos políticos nesta encenação e no seu silenciamento.
Mas a dimensão disto é maior - e assustadora. Perpassa aqui uma noção de excesso de confiança na impunidade, uma cultura de poder paralelo na instituição militar - que parece conseguir comprometer e calar o próprio poder político; uma cultura quase de golpe de Estado subterrâneo. Que talvez ponha em perspectiva os casos das messes, da corrupção reiterada na compra de equipamento militar (dos Pandur aos submarinos) e por aí fora até ao Fundo de Defesa do Ultramar, até ao princípio dos tempos.
O caso de Tancos vai muito para lá das responsabilidades políticas ou criminais de uns larápios ou de um Governo. É o regime que está em causa.
João Paulo Batalha
Caso de Tancos em análise
Luís Garriapa, editor de sociedade da SIC, analisa o despacho de acusação do caso do encobrimento das armas de Tancos. (SICNoticias)